AO INESPERADAMENTE “piscar o olho” às autoridades angolanas e oferecer-se para “desenvolver esforços” no sentido de desanuviar a tensão actualmente existente nas relações entre Portugal e Angola, Mário Soares deu uma magistral lição de como se faz política e como se ocupa um “espaço” que estava vazio e que o actual Presidente da República não soube (ou não quis) preencher.
Não é segredo para ninguém que Soares é, desde há muito, persona non grata do regime angolano e “alvo” por diversas vezes da ira dos diligentes editorialistas do “Jornal de Angola” que nunca deixaram passar em branco as críticas que publicamente o antigo Presidente fez ao governo angolano e a algumas das suas “particularidades”. Mas isso não impediu que agora, aos 88 anos e recém-saído de um internamento hospitalar, com um sentido de oportunidade próprio de quem sabe o que é a política e a sua arte, Soares deitasse para detrás das costas, zangas, amuos e ressentimentos e surgisse como potencial mediador de um conflito que, mais do que “parte”, o nosso País é “palco”.
Uma lição para um Cavaco Silva cada vez mais ausente e confinado a um palácio de Belém que se assemelha assim a uma espécie de Castel Gandolfo em versão lusitana e também para quem, investido agora em funções de responsabilidade política em Lisboa e que, por muitos diligente e solícito que se mostre para o governo de Luanda, não deixa de ser visto e na prática tratado, pelas próprias autoridades angolanas, como seu mandarete de ocasião – quanto mais não seja pela estranha celeridade com que deixou de considerar Angola como “um regime corrupto e criminoso” para lhe prestar agora uma vassalagem desajustada e contraproducente.