José Paulo Fafe

Cunhal e a venda de munições ao Chile de Pinochet

PELOS VISTOS e contrariamente à estéril e pelos vistos desajustada “onda” que assaltou as redes sociais nas últimas horas e que dava como certo que, em 1987, na Assembleia Geral das Nações Unidas em 1987, o governo português de então (liderado pelo actual Presidente da República) teria dado instruções ao embaixador português para votar contra uma proposta de resolução que exigia a libertação de Nelson Mandela, parece que as coisas não foram propriamente assim – por muito que custe a quem já se preparava para somar mais esse “pecado” aos muitos que Cavaco Silva inegavelmente possui.
Mas essa autêntica “histeria colectiva” que tomou conta da nossa blogosfera (a que o embaixador Seixas da Costa num interessante  post do seu blog chamou como um verdadeiro “follón“, utilizando assim uma terminologia bem castelhana…), levou a que ontem, no decorrer de uma conversa com um amigo, ainda o episódio de 1987 não estava devidamente esclarecido, surgisse uma vaga lembrança de uma estranha posição assumida, em 1974, pelo então ministro sem pasta Álvaro Cunhal relativamente a uma venda de material militar ao Chile do general Augusto Pinochet. E como não há como puxar pela memória (e pelos livros…), em poucas horas encontrámos o “novelo” e os detalhes de um episódio que reflecte bem como, tantas vezes, as apregoadas e radicais posições públicas são pura e simplesmente esquecidas, deitadas para detrás das costas ou mesmo cínica e hipocritamente diluídas sabe-se lá em nome de quê…
Foi o que sucedeu no Conselho de Ministros de 24 de Junho de 1974, quando o ministro da Defesa Firmino Miguel surgiu na reunião, nas palavras do então primeiro-ministro Adelino da Palma Carlos, “um bocado contrafeito” com um problema para o qual precisava de uma posição oficial do governo: “Tenho aqui um problema. O exército quer vender munições para o Chile“. O próprio primeiro-ministro, e os ministros Francisco Pereira de Moura, Almeida Santos e particularmente Salgado Zenha foram alguns que desde o primeiro momento se opuseram radicalmente a essa venda – isto apesar do valor da encomenda ser de 130 mil contos, o que na altura e com subocupação da indústria militar “vinha mesmo a calhar“. Segundo os apontamentos de Palma Carlos, a discussão sobre este tema tomou conta de grande parte da reunião daquele conselho, com a esmagadora maioria dos ministros tomando posição contra a venda, só com Firmino Miguel algo contemporizador e curiosamente apenas um ministro que, impávido e sereno, defendia uma posição que pouco tinha de ambígua e que, na prática, viabilizaria a venda das munições ao regime militar chileno e à sua máquina repressiva: “Tornemos isto um contrato comercial vulgar“, defendia Álvaro Cunhal  “abençoando” assim a transacção entre a então jovem democracia portuguesa e uma das mais sanguinárias ditaduras latino-americanas de sempre – pouco se importando com o que os seus colegas argumentavam, como por exemplo Salgado Zenha, que ainda segundo as notas de Palma Carlos, justificava assim o seu voto negativo: “O prejuízo enorme de credibilidade das nossas intenções é muito mais elevado que os 130 mil contos, é um balde de água que as pessoas nunca entenderiam (…) Esta transacção terá um saldo largamente negativo com a nossa consciência“. Pois é, mas pelos pelos vistos para o dr. Cunhal não tinha…

18 ComentáriosDeixe um comentário

  • Amigo ZPF
    Dessa não sabia eu mas a verdade é que não me estranha.
    Afinal os extremos tocam-se e como todos sabemos Cunhal não passava dum projecto de ditador que se não tivesse tido um belo “ansaime” tinha-nos mordido a todos na jugular.Vinha bem treinado da URSS a sua Pátria por excelência.
    Uma passagem mais na vida insólita desse personagem altamente sinistro da nossa História.
    Será que a Judite se esqueceu de a mencionar?

  • Como é possivel ser tão primariamente anticomunista ao ponto de inventar uma história destas? O sr. Fafe devia ter vergonha de tentar manchar a figura e a honra de alguém que é um símbolo da luta antifascista como é Álvaro Cunhal, cuja vida exemplar é um livro aberto e sem contradições de qualquer espécie. Isso não passa de uma provocação reles de reacionários de direita de que pelos vistos o sr. se tornou porta-voz. Tenha vergonha e não insulte a memória de um homem como Álvaro Cunhal!!!!!

  • Cuide-se e vá ao psiquiatra, ou torne-se autor de ficção barata, Sr. Fafe.
    Tenha a dignidade de não se pôr a ridículo, já bastam os boatos que por aí andam, neste país de mesquinhez e de medíocridade de que o Sr. parece querer fazer parte.

  • Vamos lá por partes:

    1. Miguel Vaz Serra: não partilho da tua opinião tão radical sobre Álvaro Cunhal, personagem que, mau grado as posições políticas que cada um possa ter, possuiu o seu papel na nossa história recente. Acho que o grande problema de Cunhal nos chamados “anos quentes” foi não ter conseguido controlar o esquerdismo de muito grupúsculo que por aí pululava e que, muitas vezes confundido com o PCP, ainda hoje muito prejuízo (histórico) causa aos comunistas portugueses.
    2: Sr. António Cabral: em primeiro lugar, gostava que ficasse claro que não inventei qualquer facto ou história. O que relato sobre a posição assumida pelo dr. Álvaro Cunhal em Conselho de Ministros acerca da possível venda de munições ao regime de Pinochet baseia-se nas memórias e notas do Prof. Adelino da Palma Carlos, então primeiro-ministro e que há muito foram publicadas (salvo erro em 1988) no livro “Um só rosto, uma só fé – conversas com Adelino da Palma Carlos” de Helena Sanches Osório e que – note-se – até hoje nunca foram desmentidas.
    Quanto ao ser “primariamente anticomunista”, vê-se que o sr. Cabral não me conhece. Não sou, nem nunca o fui. Como também nunca fui comunista. E sabe uma coisa? Vivi três anos e meio num país então do chamado e hoje já desaparecido “bloco comunista” e deparei-me com coisas boas, outras menos boas e outras más e muito más. E essa minha estada nesse país (Cuba, no caso) permitiu-me hoje ter uma profunda admiração por quem acreditou na pureza dos ideais que os levaram a fazer uma Revolução, ainda que não os partilhe, e ao mesmo tempo dissipar qualquer dúvida que naturalmente um adolescente, como eu na altura o era, poderia e até deveria ter sobre o comunismo.
    E quanto ao dr. Cunhal, não sou daqueles muitos que passaram a admirá-lo e quase a venerá-lo após o seu desaparecimento físico. Nunca o admirei – nem antes, nem depois. Limitei-me, desde que o conheci a respeitá-lo. E não é lembrando uma história e factos que são indesmentíveis (por muito desconfortáveis que possam naturalmente ser…) que falto ao respçeito ao dr. Cunhal. Estamos entendidos?
    3. Quanto ao primeiro anónimo, agradeço penhoradamente o cuidado mostrado com a minha saúde (neste caso mental), mas julgo estar óptimo. E quanto à expressão de “autor de ficção barata”, não considero o Prof. Adelino da Palma Carlos como tal. Foi nas suas memórias e notas que me baseei para lembrar uma história que, por muito que o incomode, os factos até hoje confirmam plenamente.
    ZPF

  • Sr. Embaixador Seixas da Costa,
    Uma correcção feita apenas após um “alerta” de terceiros, diga-se em abono da verdade…
    É que lá para as “minhas bandas” o termo usado seria mais “un desmadre”!
    Abraço grato,
    ZP

  • tá visto que não aprendeste nada em cuba. Tempo perdido, O teu lugar é entre os guzanos lá em miami, lá é que te deves sentir bem ó fafe, meu ganda reacionário

  • Isso não passa de uma calúnia. Álvaro Cunhal a patuar com a junta militar fascista de Pinochet? Isso só na cabeça e na pena de quem não percebe nada de nada. Onde é que vc estava nessa altura? De cueiros? Ou já tinha idade para suspirar pela Mocidade Portuguesa?

  • Obrigado pela informação disponibilizado ZPF.
    Gosto de história e gosto de saber estes pormenores que fogem ao conhecimento do comum.
    Melhores cumprimentos

  • Amigo ZPF
    Como sempre respeito todas as opiniões apesar de e mesmo que não respeitem as minhas que sei não ser o teu caso. No entanto e por mais que livros da carochinha e o “tempo” tentem limpar o nome de Cunhal, ele é a versão portuguesa de tudo o que aconteceu na Rússia de 17 e depois de tudo o que aconteceu até cair a cortina de ferro e o desmoronar dessa ideologia que é o Comunismo. Era o menino de ouro do Kremlin Soviético.Viveu lá num Hotel fantástico em plena Praça Vermelha no coração do mal.
    Todos sabemos o que foi ( e ainda é ) o Comunismo. O que fizeram aos povos,Países independentes esmagados pelos tanques Soviéticos, a fome, os assassínios, o exagero do muro de Berlim(uma vergonha Universal) e como assassinavam quem queria fugir daquele “Paraíso”.
    Só o facto de um cidadão estar preso no seu próprio País já seria demasiado,quanto mais ser assassinado por querer sair.
    É a pensar nesses mártires que durante décadas lutaram pela liberdade e morreram pela Democracia que digo que Cunhal não é exemplo de nada muito menos exemplo de Democrata.
    Resume-se a uma frase:”Um homem que lutou contra uma Ditadura na mira de implantar outra MUITO pior”

  • Sr. Vargas,
    Acredite que o seu comentário me causou um grato momento de boa-disposição. Sabe porquê? Porque, modéstia à parte, “cheira-me” que eu percebo bem mais destes assuntos (Chile, inclusivé) que o sr. alguma vez imaginará. Mas principalmente pela questão que me coloca – “de cueiros ou já tinha idade para suspirar pela Mocidade Portuguesa?”. Pois é, sr. Vargas, nem uma coisa nem outra, embora daí a uns meses tivesse vivido uma experiência inolvidável e durou três anos lectivos: frequentar uma escola secundária cubana, daquelas onde se trabalhava de manhã e estudava à tarde e em que é visível uma clara “formatação” militar a todos os níveis. Ah, é verdade… e não me queixo. Passe bem! ZPF

  • Muito bem: mais, eu até posso testemunhar que foi Cunhal que fez o rombo no Titanic e carregou no detonador do terramoto que em 1755 arrasou Lisboa.
    Palma Carlos, Helena SANCHES OSÓRIO. tudo pessoal sem nenhumas contas para ajustar com Cunhal.

  • Vítor Dias;
    Do Titanic já me tinha constado – agora do terramoto (foi mais maremoto, mas está bem…) de 1755, essa foi a primeira vez.
    Mas agora a sério, até porque vc. merece essa natural consideração: que tal consultar as actas do Conselho de Ministros em causa? Se a si não lhe basta a palavra do Prof. Adelino da Palma Carlos, trazida a público pela Helena Sanches Osório (não percebi a “caixa alta” por si usada no apelido…), certamente existirão documentos sobre o assunto. Ou não? Cumprimentos, ZPF

  • ui esta gente a falar dos outros assim nunca vamos a lado nenhum…o país atual precisa de boas soluções esqueçam esses tempos e o melhor mesmo é pensar na realidade atual…se teem a barriga cheia muitos estã a passar fome.

  • Para além do livreco que menciona,qual ou quais os documentos oficiais (actas do Conselho de Ministros) que consultou para verificar a veracidade dessa historieta???
    Tenha vergonha, já que dignidade não tem nenhuma!!!!!

  • O sr. Gilberto Jesus devia aprender a ter alguns modos e termos na forma como se me dirige – especialmente no segundo e último parágrafo do seu destemperado comentário e que revela bem o que o move. Mas pode por ora contar com a minha benevolência de, no mínimo, não o mandar aquela parte – que era o que merecia.
    Não lhe chega o livro e a palavra do Prof. Palma Carlos? Problema seu, porque para mim é até prova em contrario basta-me. Prove-me o contrário, que eu não terei qualquer dúvidas nem problemas de dar-lhe voz e espaço no meu blog. É se calhar isso que nos diferencia. Isso é a educação… Percebeu? Ou ainda não? Espero que sim!

  • Álvaro era um disciplinado estalinista! Um social-fascista dos quatro costados! Estaline mandou matar milhões dos seus compatriotas! Estaline celebrou um acordo com a Alemanha nacional-socialista. E partilhou, retalhou a Polónia com a Alemanha! E mandou matar milhares e milhares de oficiais polacos, prisioneiros de guerra. Foi esta a “Escola” de Cunhal…lamento muito!

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