HOJE, PASSADOS que são 40 anos sobre o sangrento golpe militar que depôs Salvador Allende, não consigo deixar de lembrar-me dos muitos exilados chilenos que conheci e com quem convivi em Cuba em meados da década de 70. Lembro-me dos já desaparecidos Beatriz Allende e Clodomiro Almeyda, ou de Marta Harnecker, de Manuel Cabieses e de Carmen Castillo, entre tantos outros. Foi através deles, das suas histórias e do seu sofrimento constante que senti e entendi o que era o fascismo na verdadeira acepção da palavra; foi através deles que conheci, sem nunca o ter pisado, o Chile; foi através deles que percebi o que era a utopia e o sonho.
Anos mais tarde, em 1989, tive oportunidade, enquanto jornalista, de assistir ao fim da ditadura militar e à transição para a democracia, num Chile ainda dominado pelo medo e pelo terror imposto pelos facínoras que o governaram durante mais de 15 anos. E há dois meses tive o ensejo de integrar a equipe que criou a campanha presidencial de Marco Enriquéz-Onimani, um jovem candidato aparentemente outsider e que “arrisca-se” a vir a disputar a segunda volta das presidenciais chilenas contra a socialista Michelle Bachelet. Filho do mítico líder do MIR Miguel Enriquéz (que foi assassinado quando ele tinha apenas 5 meses de idade), enteado do senador socialista Carlos Onimani e neto de Rafael Gumúcio, um dos fundadores da outrora influentíssima Democracia Cristão, Marco representa bem um novo Chile que, ainda que não renegando um passado indiscutivelmente traumático e polémico que culminou no dia 11 de Setembro de 1973, conseguiu ultrapassar com uma reprimida mágoa e dor um período triste e de medo. Foi há quarenta anos…