SEM QUALQUER desprimor pelo autor, pessoa que aliás não conheço, o artigo assinado hoje no “Diário de Notícias” por Sérgio Figueiredo e intitulado “A entrevista que não aconteceu” é um claro, frontal e violento “recado” do seu amigo José Sócrates ao Partido Socialista, à sua direcção e particularmente a António Costa – um recado que vai calar fundo no Largo do Rato, que ali vai causar óbvios estragos e que vai condicionar e marcar a estratégia socialista no decurso dos próximos meses. O texto é o texto de um amigo, um texto apesar disso pesado palavra a palavra, contido quando a cautela o exige, excessivo quando a raiva não o permite. E se a cautela tem obviamente a ver com questões de foro jurídico-legal e que se prendem com a defesa do amigo, a raiva, essa, tem única e exclusivamente a ver com a postura oficial socialista que irrita e deixa Sócrates à beira de um ataque de nervos. Percebemos, através de Sergio Figueiredo (por sinal director de informação da TVI…), que ao fim de seis meses, o antigo primeiro-ministro está a sentir-se, mais do que só, abandonado por quem – pensava ele – mais lhe devia solidariedade e lealdade; percebemos, com este artigo, que Sócrates não está disposto a poupar quem quer que seja, que não hesitará em desviar-se um milímetro que seja da sua estratégia de defesa, mesmo que ela possa prejudicar o seu partido neste período pré-eleitoral; percebemos finalmente, por indirecta pessoa e depois deste violento ataque, que irremediavelmente Sócrates e Costa estão de costas voltadas e aparentemente sem diálogo possível.
Vale a pena ler o texto. Aqui fica:
“1.A entrevista estava pedida e previamente combinada. Queríamos divulgá-la na data, prevista por lei, para a revisão da medida de coação. Se fosse libertado, era notícia. Se continuasse na prisão, também. Dezenas de supostas pistas, provas, factos ou meras insinuações precisavam de uma explicação. Ou da falta dela. Certo é que o famoso contraditório seria mais do que necessário, face à sequência quase diária de notícias que invariavelmente o encaminham para o banco dos réus. Na primeira pessoa, melhor ainda.
Apesar de já o ter feito por duas vezes, era portanto inegável o interesse jornalístico de novo testemunho público de José Sócrates. Se o homem queria falar, não havia que hesitar. Mas hesitei. Mesmo que, como se percebeu depois, entre o que queríamos saber e o que ele tinha para dizer não houvesse conciliação possível.
A hesitação não tinha a ver com a falta de interesse. Nem com falta de noção, porque sabia do impacto que um texto que assinei neste jornal, dois dias depois da detenção – “Gosto de Sócrates” -, tinha então provocado na redação. Uma redação a que ainda não pertencia, mas que, em pouco mais de cinco meses, deu-me este sentimento de orgulho, que publicamente assumo, sendo intimamente meu, de fazer parte e de ser o primeiro que hoje responde por ela.
Quem responde por uma equipa deve, antes de tudo, responder por si próprio. E arrisco revelar que fui questionado pela minha gente, jornalistas de corpo inteiro e cara destapada que queriam simplesmente saber porquê. Talvez receando que as minhas amizades condicionassem o seu trabalho, a cobertura editorial do mais importante acontecimento de uma nação, a prisão de alguém que chefiou o seu governo.
O porquê já estava impresso na página 14 do Diário de Notícias de 24 de novembro de 2014: “Faço-o dividido entre quem, intimamente, quer acreditar no equívoco, que tudo seja esclarecido, que a inocência seja declarada, e aquele que, anos e anos, se indigna com o país dos intocáveis, contra o sistema que protege os poderosos, contra a impunidade de poucos e a vulnerabilidade dos dez milhões de outros.” Sobre condicionamentos, quase meio ano volvido, só a própria redação da TVI pode falar. Ou, antes dela, os cerca de 1,8 milhões de portugueses que diariamente preferem a informação que passei a dirigir.
Se meio ano passou, o constrangimento ficou maior. Seis meses sem culpa formada, prisão sem acusação, alguma coisa terá feito, senão, senão, lá vem a presunção. Foram eles que inverteram o ónus da prova: Sócrates continua suspeito mas é a Justiça que fica sob suspeição. O sistema apanhou um poderoso, o odiado está capturado, dez milhões esperam que algo aconteça. Somos todos nós, que nunca estivemos tão vulneráveis.
2. Não devo nada a ninguém. Muito menos a Sócrates. Ao contrário de outros, outrora amigos, eternos da onça, que se escondem entre as frases ocas que proferem e as visitas que não lhe fazem. Partido cobarde, partido escondido, partido assustado. Nem é sequer o partido relativo, dirigentes de O”Neill, engravatados todo o ano, que se assoam à gravata por engano.
Não há engano entre os socráticos, apenas cálculo mental. Contas sem valores. Quantos mais votos contam, quanto mais puxam pela cabeça, mais o rabo se lhes descobre. Mais impressionante que a coragem de Sócrates em permanecer dentro de uma cela, entre delinquentes, é a falta dela em António Costa e na maioria dos dirigentes socialistas, que deliberadamente confundem justiça com amizade. Esperava mais, porque já lhe vi mais.
Salvo raríssimas exceções, mostram a sua raça num silêncio ensurdecedor que envergonha mesmo aqueles que detestam Sócrates. Miguel Sousa Tavares, Pedro Marques Lopes e até o “comuna” Pedro Tadeu, como se autodefine, insuspeitos colunistas, que não pertencem à família, nem de perto nem de longe, escreveram nesta semana a indignação da forma que nunca se ouviu em qualquer camarada do Rato. Um barco cheio deles, com um comandante à deriva – ou preso, porque o último líder do PS está no Alentejo e, espera-se!, a aguardar pelo dia em que responderá por corrupção e outros crimes graves.
3. No fim de contas, a entrevista não aconteceu. Às 22 perguntas que a TVI tinha para fazer José Sócrates não quis responder. Não tinha tratado pessoalmente do assunto, mas acabei por ser eu a confrontá-lo com elas. Entrar numa prisão não é uma experiência agradável. Visitar um ex-primeiro-ministro preso é um momento único, difícil de esquecer. Ou simplesmente difícil. Estivemos, eu e o meu camarada de redação António Prata, uma hora lá dentro. Conversa dura, ouvindo o que não queríamos, dizendo o que não podia ficar por dizer.
Conversa feroz, animal enjaulado. Ninguém ousa sentir o que um prisioneiro sente. Sei o que senti e imagino o que António Prata viveu. Saímos de lá em silêncio – a única palavra que repetia para si próprio, mas em voz alta, é aqui irreproduzível. Saímos mais pesados, sem entrevista, mas saímos. Uma hora depois. Não seis meses.
Sócrates pode ser mentiroso, pode ser odiado, pode ser odioso, pode ser intratável, pode ser malvado, pode ser acusado, julgado e condenado, pode ser corrupto – pode ser tudo o que magistrados têm o dever de provar e um juiz de julgar, seja o que for. Não é, porém, de nada disto que se trata quando um homem, naquelas condições, se recusa ir para o conforto da casa e a companhia dos filhos. É coerência, se estiver inocente. É coragem, em qualquer dos casos. Aquilo que fugazmente vi não paga arrogância ou o preço da vitimização.
Não temos pena. Apenas pânico – se a investigação judicial falhar e a acusação não produzir provas consistentes. E pejo – pelo nojo dos políticos surdos-mudos em que em breve vamos ter de votar.“
Amigo ZPF
Os Partidos nunca foram prioridade para “a sede” de Zé Pinto de Sousa,”o” Sócrates que vive agora em Évora.
Primeiro esteve no PSD, depois foi parar ao PS e nesse conseguiu enrolar tudo e todos até tomar conta “daquilo tudo” chegando a PM.
Já todos os Jornais falavam em casos de corrupção muito evidentes e no entanto,Costa e todos os outros ignoraram. Nisso o 44 não tem culpa alguma(foi longe no menos mau e no péssimo porque o deixaram).A sede de poder foi mais importante que a verdade dos factos.
Todos sabemos o que Sócrates diz dele mesmo. “Sou um animal e feroz”.
Não posso estar mais de acordo.
Um animal feroz e ferido é o pior inimigo que se possa ter e Costa é o que tem agora “à perna”.
Temos pena.
Criou o monstro e o monstro agora o comerá,como nos filmes de Hollywood!