A SUGESTÃO que, por interposta pessoa (no caso Vítor Ramalho), Mário Soares fez no sentido do Partido Socialista referendar internamente uma hipotética opção por tentar formar um governo à esquerda, revela que, pese os seus 90 anos, Soares mantém uma lucidez política que falta a muitos dos seus camaradas. Ao seguir o conselho do “pai fundador” do PS e promover esse referendo, António Costa terá a hipótese de legitimar perante os críticos dessa opção a súbita e historicamente “contranatura” viragem à esquerda do partido e escudar-se atrás de uma decisão maioritária, que lhe permitirá assim desresponsabilizar-se da arriscada escolha de uma estratégia política que não foi, nem ao de leve, sujeita ao escrutínio do eleitorado. Mais: à partida e tendo em conta o apetite pelo poder que se vislumbra nas segunda e terceira linha dos socialistas – ou seja, onde estão os votos… – a vitória de um “sim” num hipotético referendo que tente legitimar acordos políticos à esquerda está praticamente assegurada. Concorde-se ou não com a solução, goste-se ou não de Mário Soares, reconheça-se que “quem sabe nunca esquece”. Essa é que é essa…